terça-feira, 27 de março de 2012

Palavras travam luta pela sobrevivência, diz estudo


Alison Flood

As palavras competem diariamente numa luta quase darwiniana pela sobrevivência, revelou uma pesquisa nova em que cientistas analisaram mais de 10 milhões de palavras usadas nos últimos 200 anos.

Tirando material do enorme projeto do Google de digitalização de livros, a equipe internacional de acadêmicos rastreou o uso de todas as palavras registradas em inglês, espanhol e hebraico ao longo do período de 209 anos compreendido entre 1800 e 2008. Os cientistas --entre os quais estão Joel Tenenbaum, da Universidade de Boston, e Alexander Petersen, do Instituto Lucca de Estudos Avançados do MIT-- disseram que o estudo mostra que "as palavras são atores que competem em um sistema de recursos finitos".

Do mesmo modo como empresas financeiras disputam participação em um mercado, as palavras competem para ser usadas por oradores ou escritores e, com isso, capturar a atenção de leitores ou ouvintes.Os acadêmicos descobriram que houve "um aumento drástico no índice de morte de palavras" na era impressa moderna. Eles a atribuem ao uso crescente de corretores ortográficos automáticos e à adoção de procedimentos de edição mais rígidos, que eliminam erros de aplicação e ortográficos.

"A maioria das mudanças no vocabulário vistas nos últimos dez a 20 anos se deve à extinção de palavras incorretamente grafadas e de erros de impressão absurdos e, também, à queda no índice de surgimento de novas variantes incorretamente grafadas e de palavras genuinamente novas", escrevem os cientistas no estudo, que acaba de ser publicado. "As palavras que estão morrendo são as que têm uso relativo baixo. Confirmamos, por inspeção visual, que as listas de palavras moribundas são compostas principalmente por palavras incorretamente grafadas e palavras sem sentido."

Mas não são apenas palavras "defeituosas" que morrem: às vezes palavras são levadas à extinção por concorrentes agressivas. A palavra "Roentgenogram", por exemplo, derivada do descobridor do raio X, William Röntgen, foi fartamente empregada por várias décadas no século 20, mas, desafiada por "X-ray" (raio X) e "radiogram" (radiografia), acabou caindo em desuso total.

Até 1980, "X-ray" tinha derrotado a concorrência, especulam os acadêmicos, por ser mais curta e porque a língua inglesa geralmente é a usada em publicações científicas. "Cada uma das palavras compete pelo monopólio do nome", disse Tenenbaum à Sociedade Americana de Física. Enquanto isso, a frase "a grande guerra", usada durante certo período para descrever a Primeira Guerra Mundial, caiu em desuso por volta de 1939, quando o mundo foi abalado por outra guerra de proporções iguais.

Grandes acontecimentos

Os cientistas descobriram que a linguagem é "drasticamente" afetada pela ocorrência de grandes acontecimentos, como as guerras; o surgimento de novas palavras nas línguas inglesa, francesa, alemã e russa aumentou "significativamente" durante a Segunda Guerra Mundial. "Isso pode ser entendido como manifestação da unificação da consciência pública, que gera um campo fértil para o surgimento de novos tópicos e ideias", escrevem os acadêmicos. "Durante uma guerra, é mais provável que a atenção das pessoas se volte a questões globais."

O aumento não foi verificado no castelhano durante o mesmo período, eles constataram, fato que atribuíram aos papéis menores exercidos pela Espanha e América Latina na guerra. A língua hebraica, enquanto isso, viveu um boom pouco após a declaração Balfour, de 1917, fato que, concretamente, abriu caminho para a fundação do Estado de Israel.

Em 1920 o índice de nascimento de palavras hebraicas multiplicou-se por cinco, na medida em que um idioma até então usado principalmente em escritos religiosos se converteu em língua falada moderna.

"De modo análogo às recessões e às fases de boom na economia global, o mercado de palavras cresce se contrai segundo se desenrolam os fatos históricos", escrevem os autores do estudo."E, numa analogia aos regulamentos financeiros que têm por finalidade limitar os riscos e a hegemonia sobre o mercado, as tecnologias de padronização, como o dicionário e os corretores ortográficos, atuam como poderosos árbitros para determinar as propriedades características da evolução das palavras."



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